Monday, September 24, 2007

LUNGWA SKA-MOLE

LUNGWA SKA-MOLE


O perigoso declínio das línguas nacionais, especialmente, da língua do foro é uma realidade dos nossos dias. Pretendo chamar atenção para o facto das nossas línguas nacionais estarem à beira de extinção, devido ao deprezo e a negligência do nosso povo. Este tema compreende uma visão breve e uma simples análise crítica sobre o elevado risco da morte das línguas nacionais de São Tomé e Príncipe.

Trata-se de uma matéria fora do meu âmbito de aplicação, mas não deixa de ser fundamental para a identificação do membro da sociedade santomense, assim como para a consolidação e transmissão coerente de conceitos e valores tradicionais que precisamos de fazer passar para as gerações vindouras. Não queria deixar de fazer referência a um link duma pequena observação feita, outrora, por um santomense no sítio, maxibim.net, onde questiona sobre este assunto. Mas, informo-vos que a mesma pode ter sido descontinuada, por razões que desconheço. http://www.maxibim.net/modules.php?name=Forums&file=viewtopic&p=333&highlight=#333.
Numa fase em que se verifica um crescimento acentuado de crise de falta identidade nos jovens santomenses, aproveito essa oportunidade para aqui poder exprimir algumas das minhas ideias e tecer algumas críticas relacionadas com a perda de características e valores tradicionais da nossa gente. A principal ideia prende-se com a falta de paixão e interesse pelas línguas foro, lungye e ngola, que servem de suporte de valores culturais que nos ligam à terra mãe, S.Tomé e Príncipe. A nossa juventude considera como sendo uma língua para indivíduos idosos, ou na casa dos quarenta anos. Nas nossas rádios tentam desesperadamente, sem qualquer consistência e coerência científica fazer "locuções" em línguas nacionais, o que resulta num descalabro total, ausência de seriedade e enorme desinteresse público. Precisamos de valorizar as nossas línguas estudando-as, comunicando fazendo o uso das mesmas em todas as circunstâncias, para que seja um sucesso e, consequentemente, uma salvação da nossa identidade cultural. Caberia então ao estado procurar definir critérios ou metodologias adequadas à implementação correcta desse tipo de iniciativa nacional.

Sendo originário de etnia fora e tendo tido contactos, embora superficiais e ao nível da oralidade, com indivíduos de expressão fora, o meu interesse incide-se particularmente sobre a origem, a evolução e a presumível morte da língua foro no arquipélago de S.Tomé e Príncipe.
Neste momento, ainda não farei as minhas análises sobre o assunto, mas assim que me for oportuno apresentarei as minhas teses. Por enquanto, limitarei em fazer apenas algumas observações críticas, citar alguns documentos ou links com artigos relacionados e deixar em aberto questões para serem debatidas no blog.

Lamento que seja um dos poucos interessados na matéria, que julgo ser de capital importância para a nação santomense, dado que a língua fora encontra-se praticamente em extinção, por falta de motivações políticas do estado ao longo dos últimos trinta e dois anos. Mas como a esperança é a última que morre, tenho a expectativa de que um dia possamos oficializar o nosso foro, após um estudo científico aprofundado e coerente do mesmo. A língua foro está a morrer! Os jovens não querem desafiar a sua geração para se libertarem da inibição pela qual sofreram as gerações que não poderiam exprimir-se em foro, porque o regime de então assim o determinava. Temos muitas músicas cantadas, felizmente, em foro, algumas em lungye e ngola. Por vezes, nem parecemos ser inteligentes!

Vejamos o caso dos cabo-verdianos. Embora se tratando de uma língua não genuína no povo africano, os músicos desse país cantam em crioulo local e diariamente têm como o meio de comunicação o crioulo. Isso faz deles um povo unido pela sua cultura, que os identifica em qualquer parte do mundo, uma vez que não sentem qualquer desprezo pela sua língua. Por outro lado, os foros nem querem ouvir falar o foro no diante de estrangeiros, especialmente, gente de raça branca, assumindo comportamentos desprezíveis. São muitos os denominados de ingratos que, querendo afirmar-se como um deles (europeus de segunda ou de terceira, segundo os seus "pontos de vista"), rezam praga ao bom-nome de S.Tomé e Príncipe, pelo facto de não ser um país que lhes projectou para um mundo puro, rico e branco, onde não existe a miséria nem a fome. A nossa língua materna, para muitas desses delinquentes, é um retrocesso ao passado e os seus falantes são apelidados de "atrasados" ou "angolar".


Ironicamente, temos assistido cada vez mais uma onda de importação do estrangeirismo nas nossas músicas. As músicas já não são cantadas por foros falantes da língua foro, como antigamente; os jovens não querem cantar ou transmitir sentimentos e tradições nacionais na sua língua materna; os foros passam a maior parte do seu tempo a copiar as letras de músicos cabo-verdianos, chegando mesmo a cantarolar na língua desses crioulos. Existem casos de músicos que têm letras nos seus álbuns escritas em espanhol! Eu diria, para que serviria a divulgação de cantigas em espanhol ou em francês para os jovens santomenses e até homens e mulheres da nossa terra? Nada de nada.

Um foro, camponês na zona de Monte-Café ou de Lembá, que nunca ouviu uma palavra sequer na língua estrangeira, pode até achar que o cantor em causa pretende gozar com os santomenses "incultos", uma vez que os ditos músicos foros acham que todos sabemos como é lindo ouvir músicas em espanhol ou em inglês, mesmo não percebendo a ponta de um corno...
Parto do princípio que essas músicas são apenas criadas, pelos cantores "analfabrutos" santomenses, com o intuito de satisfazer os caprichos dos estrangeiros que nos desprezam, tal como esses foros infiéis, a nossa cultura. Quando esses infiéis começam a cantar na língua materna de cabo-verdianos ou espanhol, sinto-me tão triste e decepcionado, que penso que estamos a adorar a nova colonização por parte de cabo verde e não só (embora continuemos a ser cativos da língua imposta pelos colonos opressores, que herdamos de forma orgulhosa e da qual nem nos entendemos). Povo algum se submeteria ou se sujeitaria a tamanha humilhação! Povo algum cantaria na língua fora, por mais bela que ela lhes soasse aos ouvidos... Só tenho a lamentar o ingrato destino a que foi condenada aquilo que ainda resta das nossas línguas nativas, que considero nacionais, e que não são de modo algum um crioulo.


Já lá foi o tempo em que os nossos pais foram obrigados a abster-se da sua língua materna em detrimento do português que mal entendiam e falavam... É a altura de pormos as mãos na consciência e olharmos o mundo à nossa volta. Todos sabemos que o mais importante e o que caracteriza um determinado povo é a sua língua materna. Vemos e temos visto que, por exemplo, um brasileiro por mais tempo que esteja num país estrangeiro jamais deixa de se expressar com o seu sotaque. Um português, porém, tal como muitos dos Palops, tendem a imitar o sotaque dos povos falantes da língua onde residem ou se encontram de passagem, desde que esses não sejam africanos! Um português que vai viver para o Reino Unido, passado alguns anos, adquire o sotaque inglês, mas quando vai viver para a Angola não adquire sotaque de pedra do “gabão”! Só para contrariar!

Algo que me intriga bastante ao nível cultural e não é o factor linguístico, mas também muito importante na caracterização de um povo é o nome próprio do indivíduo que integra uma dada sociedade. No nosso caso em particular, nota-se que milhares de foros perfilham os seus filhos com nomes estrangeiros, mas não africanos!

Nomes esses (infelizmente, adorados e admirados), inúmeras vezes, com significados pouco recomendáveis, e outros que são de individualidades ocidentais e de vulgares actores de televisão brasileira ou filmes euro-americanos. Imaginem casos de crianças que se chamam Yuri, Lenine ou Kolorov, que ao se tornarem jovens estudantes que emigram para se formarem na Rússia ou países do leste europeu, de onde são originários os seus nomes (os Yuris, Lenines ou Kolorovs), acabassem por ser perseguidos por bandos de seus “charás” russos com armas brancas, como facas, matracas e cacetes pelas ruas das cidades ocidentais. Seria um pouco irónico, mas é o que acontece em diversas cidades europeias...


No Brasil, os Edineys, os (qualquer-coisa)(son) ou (...)ton, wanderleys, etc., perseguidos por polícias armados, seus “charás”, como se tratassem de bandidos assaltantes! Bonito. Não acham? As pequenas que hoje têm nomes de "deusas" e "rainhas" das novelas brasileiras, as vagabundas e "meninas da vida", as Shirleys, Vivianes, Lindleys, etc., sabem que isso não passou de uma propaganda e estupidez por parte dos seus pais que iludidos pelas produções televisivas indecentes e racistas euro-brasileiras impingidas nas sociedades africanas – Palops, particularmente. Uma vez que em Portugal, os pais continuaram a chamar os seus filhos e filhas de António/Antónia, Manuel/Manuela, João/Joana, Pedro/Ana, Paulo/Paula, José/Maria, e assim sucessivamente, o que outrora acontecia nas ex-colónias por motivos óbvios. Não se deixaram colonizar tanto como os estúpidos negros, que caíram em graça as histórias e cenas fictícias que tomaram como verídicas.

Uma vez falando de cultura, que é a maior riqueza de um povo e a necessidade que os elementos de uma sociedade têm de serem cultos, posso dizer que existe um tremendo erro por parte dos foros. Quanto ao que muitos entendem por se tornarem cultos deixa-me de certo modo perplexo. Não sei isso se deve à estupidez de alguns foros ou ao preconceito herdado pelo neo-colonialismo português em S. Tomé e Príncipe. Tenho uma opinião contrária àqueles foros que se julgam cultos por lerem livros para cidadãos europeus, ou tais que os conteúdos sejam pouco recomendáveis aos africanos e sem quaisquer interesses culturais construtivos.

Muitos desses sujeitos com alguma ignorância, possuidores até de uma formação ao nível superior, são ingenuamente induzidos em erro ao mentalizarem-se nesse sentido. Como dizia uma especialista, não se trata de ler, ler qualquer coisa, mas sim saber o que deve ler e se essa leitura contribui em certa medida para o enriquecimento cultural do indivíduo. Observou-se, entretanto, que infelizmente muita gente não sabia que tipo de obras seria adequado para a leitura e que servisse de estímulo ou elevasse culturalmente o conhecimento do indivíduo.

Portanto, muitos ouviam que alguém famoso leu um livro de carácter social, pedagógico ou religioso, e imediatamente punha-se a lê-lo, sendo inúmeras vezes inapropriado e sem qualquer valor cultural. Pois, existem livros que têm um determinado propósito e não são recomendáveis, ou ainda, a cidadãos de qualquer idade. Os foros, de uma maneira geral, não têm a mínima consciência da diferenciação desses parâmetros e julgam-se cultos por terem lido muitas obras de "grandes escritores" ou "grandes historiadores" europeus, euro-brasileiros ou euro-americanos!... Esquecendo-se que as mesmas nada têm haver com a sua cultura e que de nada lhe servirão para o contributo que pretende dar à sociedade santomense. Seria igualmente absurdo recomendar a um francês que leia obras de escritores africanos para se cultivar!


Por amor de Deus, abram os olhos e deixem de ser dominados pelo diabo! Há mais de cinco séculos que nos deixámos levar pelas cantigas do diabo branco que sempre nos espezinhou e maltratou nas nossas próprias terras. Se um dia o diabo branco nos disser para que comamos lesmas porque faz bem a saúde, atiraremos de forma selvagem a cada espetada deste molusco sem pestanejar, não é? Pois, parece irónico, mas é mesmo assim que vivemos nas nossas terras. Vêm cá brancos dizer que devemos cortar bananeiras e semear macieiras e lá vai o foro cortar todos os pés de bananeiras que encontrar e semear macieiras, apesar de presumir que aquilo pode não dar nada! O que lhe interessa naquele instante é que o salvador enviado por deus veio trazer-lhe o milagre e a riqueza para o seu bem-estar. Sobre esse assunto ainda tem muito que se lhe diga... Abracemos aquilo que é nosso com amor e carinho, que outros só querem destruir para fazerem valer os seus valores e daí tirarem o partido deles.

Fazendo só um pequeno parêntesis e olhando só um pouco para trás na história recente do nosso povo, onde o colonialismo português ainda nos traz grandes mágoas, devemos sempre ter em mente os mais de cinco séculos de invasão e opressão perpetrados por esses colonos. Colonos salteadores que passaram a vida a pilhar e saquear todos os tesouros que puderam da África, não puderam deixar de retratar as suas marcas do passado. Hoje todos podemos ver os bastardos, mulatos, que são vestígios desses colonos insanos nos nossos territórios, que abandonados e desprezados nas terras do ocidente são considerados "pretos".

Concluindo, todos falam a sua língua materna na América, na Ásia, na Europa (e em alguns países africanos, de grandes dimensões territoriais, que não tiveram grandes influências de colonos invasores e opressores) sem que esse facto seja visto como algo repugnante. Essas ideias apenas ocorrem em mentes dos nossos cidadãos ignorantes é que julgam que a morte da sua língua materna em detrimento da dos colonizadores e opressores são uma "mais-valia" para a sua cultura.

Por favor, salvemos a língua do Foro (que não é um crioulo como erradamente se diz), a língua dos Monkos (lungye) e a dos Angolares (ngola). Lungwa non sa kala non ni lwa, bamu sebe de djandjan pa e na mole de fa!

Jykiti Wakongo

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